Corneta do Cunio – Santo, pela mão dos homens

POR ALBERTO CUNIO  

Beatificados alviverdes, os bons preceitos recomendam que não devemos
discutir três assuntos magnos: religião, política e futebol. O primeiro, está
claríssimo. Mexe com a fé e esta é intocável. O segundo, para mim, é por ser
perda de tempo. O terceiro, beira a galhofa. Para os palmeirenses, porém, o
primeiro e o terceiro se fundem quando o assunto é “São” Marcos.

Uma vez, quando bem mais jovem, questionei aos quatro ventos como “Padre
Cícero”, ou “Padim Ciço” para os fiéis (não “aqueles”), poderia ser levado pelo
povo à categoria de santo, se ele fora excomungado pela igreja católica romana
(há controvérsias sobre este fato), seu milagre considerado um embuste e sua
história remetesse ao que há de mais provinciano e coronelista na política
nordestina. Pois é.

Falar aqui que a voz do povo é a voz de Deus soará ridículo. Então vou
abordar o assunto por outro lado.

A história fez de nosso clube detentor de inúmeros ídolos, graças também
aos inúmeros títulos. Graças, pelo menos história ainda temos. E hoje vivemos
um caso inédito, o de conviver com um ídolo, que escreveu parte desta gloriosa
história, mas ainda pode ser visto em ação, ouvir os gritos da torcida, sofrer
os amargores das derrotas e a adrenalina das vitórias. Nada disso seria
estranho se não estivéssemos vivendo uma seca de conquistas há mais de uma
década (exceto pelo Paulistão 2008) e o momento em nada compactuar com glórias e ídolos.

Marcos é o protagonista desta situação inusitada. E está pagando
caríssimo por isso. 

Se por um lado nosso ídolo é “blindado” pela fé alviverde, que em 1999 o
canonizou após a conquista da Libertadores, ainda cai sobre seus ombros uma
enorme responsabilidade por continuar  a “salvar
a pátria” nos momentos mais agudos e críticos que vivemos.

Nosso humano levado à condição de santo, no entanto, ainda é muito
humano. E como tal erra, acerta, agrega, desagrega, fala bobagens, conserta em
seguida. Haja santidade, haja paciência, haja amor pelo Palmeiras.

Este misto de herói, que por um lado tira o corpo fora e lava as mãos na
hora do aperto, deixando o circo pegar fogo, e do outro tem a aura do
intocável, que está acima do bem e do mal, acaba por deixar confuso até seus
próprios leais seguidores. Marcos precisa, ele mesmo, definir estes limites. E
para isso deve deixar claro qual é seu papel dentro do clube. Se vai continuar
como atleta, se vai para a comissão técnica, se vai ser dirigente, se vai para
a arquibancada, ou se quer apenas ser lembrado como “santo”. Como e quando.

A polêmica na qual se envolveu na semana passada, até com bate-boca em
emissoras de televisão, mostra uma exposição excessiva, uma fragilidade de
comando e direção do clube, um direcionamento de foco onde não interessa.
Marcos é grande. Devemos inúmeras alegrias a ele. Jamais esqueceremos. Mas o
Palmeiras é enorme. Existe A.M. e existirá D.M.. Esperamos que seja eterno, pelo
menos enquanto viva o último palmeirense.

Enquanto nós aguardamos nossa própria canonização, pois o primeiro
milagre já nos tornou beatos (amar tanto um clube que nos despreza), não
precisamos que nosso “santo” tome o lugar dos anjos e toque para si as
trombetas. Ou até mesmo a minha corneta.


Comments (10)

  1. Emerson Prebianchi

    Grande inspiração heim Presi!!!!
    Muito bacana, PARABENS E VIVA O SANTO!!!!!!!!!

  2. Alberto Cunio

    #6 Cássio, esta preservação precisa vir dele mesmo. A exposição desnecessária de um ídolo como ele faz com que seja diminuída sua importância sem igual dentro da história do Palmeiras. Hoje temos muito pouco com o que nos orgulharmos. Marcos é uma grande parte deste pouco.

  3. Marco Túlio de Vasconcelos Dias

    #6 – Cássio Andrade
    Gênio.
    *********
    O Marcos as vezes tinha que ser menos sincero… só isso! Pensar um pouco (ou melhor, MUITO) antes de falar.

  4. Rodrigo Bucciolli Pereira

    Texto sensacional Cunio.
    Eu já fiquei puto com algumas atitudes do Marcos. Mas o que ele já fez pelo Palmeiras paga com sobra qualquer deslize que ele cometa. Temos é que valorizar o último ídolo verdadeiramente identificado com o Palmeiras, porque depois dele, nesse futebol business que temos hoje, não terá outro jogador a defender somente o Palmeiras em toda sua carreira.
    O Marcos já é uma lenda. Nós temos é que aplaudí-lo enquanto ainda joga com o nosso manto.

  5. Cássio Andrade

    Não me lembro do Marcos auto-intitular-se Santo.

    Nem me lembro dele tirando o corpo fora quando falha.

    Não me lembro dele aceitar proposta do Arsenal para ganhar muito mais após ser campeão do mundo,e preferir jogar a 2.divisão pelo Palmeiras.

    Também não me lembro dele sair tagarelando que ele é intocável ou insubstituível.

    Também não me recordo dele deixando de jogar algum jogo porque estava fazendo corpo mole.Pelo contrário,todos sabemos das limitações que tem pela quantidade contusões que teve.Todas defendendo o Palmeiras.E se precisar se jogar no pé de um cavalo(como o vi fazer contra o Rafael Moura do gambás e fraturar a clavícula) para defender o Palmeiras,mesmo que isso custe uma nova contusão ele vai fazê-lo.

    O pecado do Marcos é ser exagerado e sincero demais.

    As pessoas confundem os maus resultados do time em campo com a sinceridade do Marcos.
    Pra mim ele devia ser preservado e não dar entrevista para ninguém mais.

  6. luiz penchiari

    Cunio, caras como o marcos e o bambi ceni precisam tomar um simancol e dar a vez para outros, saber parar.

    sabe aqueles anuncios tipo “pare de fumar em 7 dias”, ia fazer duplo beneficio ao marcos. desculpe a cornetada e um abraço

  7. VERA LUCIA CLORETTI

    Excelente texto. Parabéns!

  8. Marcio Zambon

    O Marcos é um caso único. Enquanto todos os outros jogadores atingiram o auge em seus clubes depois de um certo tempo ou saíram dos mesmos ao chegar nesse nível, o Marcos o fez logo em seu “início” no Palmeiras e jamais deixou o clube, tendo que carregar esse “peso” desde então. Pra ajudar, a direção de futebol nunca estabeleceu regras de conduta aos jogadores. Haja psicologia para cuidar do caso…

  9. Sérgio Modesto Frugis

    Marcos falhou assim como outros falham, mas creio que sua eficiência ainda supera as falhas. Acredito que possa continuar mais um tempo defendendo nossa meta. Porém, não pode mais falar de cabeça quente… é uma declaração pior que a outra… Abraços.

  10. Gaetano Misiti Neto

    Grande Cunio. Em meio a uma montanha de comentários apaixonados, surge uma apaixonado fazendo um comentário sensato. Também concordo. Ainda que o posicionamento emotivo de Marcos tenha atiçado alguns corações palmeirenses, sua responsabilidade como capitão de seu grupo falhou. Quem é santo, sofre as ofensas em silêncio e, através do exemplo, responde aos seus críticos.

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