Quem é o dono de um clube de capital aberto? – 2
Por Luís Fernando Tredinnick*
Na semana passada
discutimos um pouco as possíveis conseqüências de um time abrir capital
na bolsa e vender mais de 50% das ações (para simplificar, 50% das
ações que controlam o clube, sem entrar em detalhes se ações ordinárias
e preferenciais). Vamos chamar essa empresa aberta de Futebol S.A.
Se
o clube abrir o capital e vender menos de 50% das ações do Futebol
S.A., a propriedade do Futebol S.A., continuaria com o clube e,
portanto, com os sócios (ainda que a menor parte seja de outros
investidores). Mas e daí?
E
daí que existem dois pontos fundamentais a serem definidos para que um
clube de capital aberto funcione, mesmo com o clube ainda “dono”:
1) O lucro a ser atingido
Uma
vez que o clube abriu o capital, os investidores que compraram suas
ações querem um retorno do seu investimento. Esse retorno é a parte do
lucro do Futebol S.A. que é distribuído aos investidores.
Então, com qual lucro que o Futebol S.A. irá se comprometer? Que percentagem desse lucro será entregue aos investidores?
Não
há como se pensar que o Futebol S.A., uma vez aberto o capital, não
deva SEMPRE buscar o lucro. Ainda que a sua “propriedade” continue com
o clube, os demais investidores também têm direitos e esses direitos
devem ser respeitados. Atualmente, os clubes conseguem amargar
prejuízos por anos seguidos sem que existam pessoas que incomodem ou
mesmo cobrem resultados financeiros melhores. Com o capital aberto,
isso não seria mais possível.
Os clubes, portanto, devem pesar a
necessidade de se ter lucro e a necessidade de se montar um time
competitivo mesmo aumentando os gastos.
Obviamente, os clubes bem administrados conseguiriam realizar as duas ações ao mesmo tempo: montar um time competitivo E ter lucro!
Apesar disso, a questão persiste: quanto o clube deve ter de lucro e quanto ele deve entregar aos investidores todos os anos?
2) Profissionalização da estrutura, ou a alteração na estrutura de poder
Se
o futebol pertence ao clube e o clube pertence aos sócios, o futebol
deveria ser gerenciado por profissionais de acordo com os interesses
dos sócios, certo? (nota: também devem ser respeitados os interesses
dos demais investidores, uma vez que minortários também tem direitos).
Quem
deve indicar o Presidente do Futebol S.A.? O Presidente do Palmeiras? O
Conselho? O Presidente com aprovação do Conselho? Imaginemos que seja o
Presidente do Palmeiras.
Atualmente no Palmeiras o presidente do
clube é eleito de maneira INDIRETA pelo conselho. O conselho conta com
ocupantes vitalícios, o que faz com que eles não necessariamente
estejam alinhados com os desejos dos demais sócios, afinal, eles não
precisam ser eleitos, certo? A primeira grande questão a ser resolvida:
o Presidente do clube deve continuar a ser eleito de maneira indireta?
Ou, assim como o Barcelona, deve ser eleito de maneira direta, com
todos os sócios tendo direito a um voto?
Uma eleição direta
tende a garantir uma maior meritocracia, ou seja, conforme o bom
desempenho do Futebol S.A., maiores são as chances do presidente do
Palmeiras se manter no cargo ou eleger o sucessor. Por outro lado uma
eleição direta tende a fazer com que as eleições sejam menos
previsíveis e mais sujeitas aos resultados obtidos no curto prazo.
Adicionalmente
o Futebol S.A, deve montar uma estrutura profissional. Posições hoje
ocupadas por pessoas que não recebem remuneração (Marketing,
Planejamento, etc.), devem ser ocupadas por profissionais remunerados!
Esses
profissionais remunerados que DEVEM SER medidos e cobrados pelo seu
desempenho. As vendas de ingressos não foi o esperado? Alguém (além do
time) deve ser responsabilizado por isso. Desvios de conduta devem
resultar em demissão! Desvio de dinheiro deve resultar na possibilidade
de alguém ir para a cadeia.
Uma
estrutura profissional significa que os demais membros do clube deixem
de ter influência sobre a gestão do Futebol S.A.. Imaginem todas as
estruturas de poder que foram consolidadas ao longo de décadas na
maioria dos clubes de futebol do país perdendo seu poder. Alguém
imagina que essa transição seja simples ou mesmo tranqüila?
Persiste
a pergunta: qual será a melhor estrutura para a administração do
Futebol S.A.? Como conciliar os interesses dos sócios e demais
investidores em uma estrutura profissional?
Conclusão
Uma possível abertura de capital, vista como a solução de todos os problemas para os jornalistas menos informados, gera mais perguntas do que respostas.
Conciliar os interesses do clube, dos torcedores e dos investidores é um desafio que ainda não foi devidamente explorado no Brasil.
Você, leitor, acredita que é possível conciliar todos esses interesses dentro de uma estrutura profissional? Ou seria melhor “manter tudo como está”?
Na próxima semana iremos discutir as vantagens potenciais que a abertura de capital pode trazer para os clubes.
Saudações AlviVerdes
*Luis
Fernando Tredinnick escreve todas as sextas-feiras no 3VV, explicando a
quem conhece e também a quem não conhece, os números no futebol.